O Demonstrativo de Fluxo de Caixa

Por  Matt Richey (TMF Verve)

Tradução e “muita adaptação” de SER-

ALEXANDRIA, VA (August 23, 1999)

 “O caixa é soberano”;

 “Siga o dinheiro”.

Se essas frases são conhecidas suas, deixe eu te apresentar um amigo meu, o Demonstrativo de Fluxo de caixa. Este demonstrativo financeiro mostra o que realmente acontece com o dinheiro dentro da firma, desde o momento que sai do Demonstrativo de Resultados até ir parar no Balanço Patrimonial.


Veja bem, não é porquê está escrito no demonstrativo de resultado que a companhia obteve um lucro líquido de $10, que o caixa do Balanço Patrimonial será aumentado de $10. Pelo nosso sistema contábil, um lucro de $10 não é traduzido integralmente em dinheiro. Isto porquê nós temos um sistema de contabilidade cumulativo, e não um sistema de entrada e saída. Hoje navegaremos por um exemplo simples que irá mostrar as diferenças entre as duas formas contábeis e, depois, nós faremos o uso deste conhecimento para entender o Demonstrativo de fluxo de caixa da Metalúrgica Gerdau (GOAU4).

Na última Sexta-feira, nosso pequeno empresário, Joãozinho, inaugurou sua barraquinha de limonada. Aqui abaixo podemos ver como estava o seu balanço patrimonial naquele dia:

Balanço Patrimonial de 20 de agosto, sexta:

ATIVOS
  Dinheiro                     $5
  Estoque (limonada em pó)     30
  Total                       $35 
 
DÍVIDAS E PATRIMÔNIO LÍQUIDO
  Empréstimo da mãe sem juros $30
  Patrimônio Líquido            5
  Total                       $35
  

Estrategicamente localizado numa esquina aonde corredores ofegantes passam freqüentemente, João servia uma das melhores limonadas do bairro e, o mais importante, exibindo uma carinha de cachorro triste, nosso astuto proprietário de oito anos, ganhava dinheiro como um bandido. Um Sábado e Domingo escaldante conspiraram a seu favor, fazendo com que ele vendesse 100 copos de limonada a um preço ridiculamente alto, de $1 o copo (que era quatro vezes o custo – vejam só! Isto equivale a uma margem bruta de 75%).

Com um grande conhecimento do negócio, nosso pequeno empresário sabia que nem todos os corredores carregam dinheiro durante suas corridas. Mas, ao invés de perder essas vendas em potencial, ele permitia que esses perdedores, ops.. consumidores, comprassem fiado e pagassem a ele em qualquer dia da próxima semana. Na verdade, metade de seus fregueses optava por essa modalidade de pagamento.

Ontem à noite, Joãozinho fechou "os livros”. Aqui em baixo temos, de forma cumulativa, o seu Demonstrativo de Resultados:

Demonstrativo de Resultados para o final de semana de 21-22 de Agosto:

 

  Vendas                      $100
- Custo de Vendas               25
= Lucro líquido                $75
 

Como você pode observar, o sistema cumulativo contabiliza itens como “vendidos”, mesmo se você não tiver recebido o dinheiro de vendas. No caso do Joãozinho, isso significa que ele embolsou um "lucro” de $75 embora só tenha recebido $50 de suas vendas (metade das vendas).

 Vamos ver o que aconteceria se Joãozinho quisesse saber agora como seu negócio estava se saindo em termos de dinheiro.

Demonstrativo de Fluxo de Caixa para o final de Semana de 21-22 de Agosto:

 

 Vendas a vista               $50
- Custo de Vendas              25
= Lucro líquido               $25
 

Em termos de caixa, Joãozinho não registraria os outros $50 de vendas até que seus consumidores tivessem efetivamente pago. Da mesma forma, ele poderia agora registrar integralmente a despesa de $25 de limonada em pó, porquê o material foi efetivamente utilizado. Este tipo de contabilidade mostra um “lucro financeiro” de $25.

Sob o ponto de vista financeiro, o Balanço Patrimonial ficaria da seguinte forma:

Balanço Patrimonial de 22 de Agosto, Domingo:

ATIVOS
  Caixa                       $55
  Contas a Receber             50
  Inventário                    5
  Total                      $110 
 
PASSIVO
  Empréstimo sem juros da mãe  $30
  Patrimônio Líquido            80
   Total                      $110
 

Como os $100 em vendas de Joãozinho foi metade em dinheiro e metade fiado, o caixa aumentou de $50 e Joãozinho registrou os outros $50 em "contas a receber" (Eta garoto bom esse, em?).

 

Observação do SER-: Vamos entender bem o que aconteceu:

 

1)      Ele tinha $5 de caixa no dia 20 de agosto, somado com os $50 que ele recebeu em dinheiro dos corredores, vai dar os $55, que é exatamente o que está no caixa do Balanço Patrimonial do dia 22 de agosto;

2)      Ou seja, ele lucrou 100 mais só conseguiu transformar em dinheiro 50!

3)      Em sua carteira ele tem 55 pratas que ele pode decidir o que fazer. Pagar a sua mãe os 30 que estava devendo, pagar dividendos aos seus acionistas (...rs). É importante entender que ele não pode fazer nada com o dinheiro fiado, a não ser comprar pó de limonada fiado achando que não vai receber calote dos corredores devedores.

4)      Destes 50 pratas que ele recebeu à vista, ele já tinha empenhado 30 no pó para limonada. Ou seja, coberto todo os custos do material Joãozinho teria ganho 20, mas não é exatamente assim que se faz.

5)      Note bem, pelo sistema contábil nós só contamos o pó de limonada como despesa quando efetivamente vendemos a limonada. Por isso contabilizamos 25 como despesa (que foi o que foi efetivamente bebido pelos corredores) e não os 30. (lembre-se que sobrou 5 em estoque)

6)      Assim, recebemos à vista 50, gastamos 25 com pó de limonada e tivemos um “lucro financeiro” de 25. É exatamente isto que faz o Demonstrativo de Fluxo de Caixa.

7)      Ele pode, ou não devolver estes 25 para a sua mãe.  É provável que não vá, pois não há juros na “negociação”.

8)      Dos 30 que ele tinha em estoque de pó de limonada no dia 20, restam 5 no dia 22. Note que é exatamente igual aos 25 que estão no custo de vendas. Estes 5 que sobraram estão no estoque do dia 22.

9)      O que aconteceu com o lucro do Demonstrativo de Resultados? Vamos ver. Os 100 que ele faturou (mas não recebeu integralmente, apenas 50) foram repassados para o Balanço, sendo 50 em dinheiro e 50 em contas a receber.

10)  Os 25 do custo de vendas foram abatidos do estoque.

11)  Logo, colocamos 50 no Caixa + 50 no Contas a Receber e subtraímos 25 consumidos do estoque, o que  resulta em 75. Que é exatamente o lucro. Como isto é um balanço (mas bem poderia se chamar balança) temos que colocar 75 no outro lado, na parte do Passivo e Patrimônio Líquido. Para aonde ela vai? Para o Patrimônio Líquido. Entenda bem, são 75 de cada lado. Os 75 do Patrimônio líquido não existem totalmente. 5 que existiam anteriormente no Patrimônio Líquido mais 75 resultam em 80.

12)  Dos 75 acrescidos ao Patrimônio Líquido 50 estão em dinheiro. E os outros 25 são: 50 vendidos fiado menos 25 do custo do pó da limonada.

Da mesma forma, todas as companhias públicas usam um sistema contábil cumulativo. O que é importante tirar deste conto heróico do Joãozinho, um astuto empresário capitalista, é que o Demonstrativo de resultados não te mostra o que está acontecendo dentro da companhia. Para a história real nós empregamos o Balanço Patrimonial, e para, como diz Paul Harvey, o resto da história, nós olhamos para o demonstrativo de fluxo de caixa.

O demonstrativo de fluxo de Caixa é dividido e três seções – Atividades Operacionais, atividades de investimento, e atividades de financiamento. Vamos navegar dentro do demonstrativo de fluxo de Caixa da Metalúrgica Gerdau.


A seção de Atividades operacionais é a mais importante, já que ela nos permite seguir o caixa gerado pela atividade fim da empresa. Antes de seguirmos para as outras seções vamos dar uma olhada no Fluxo operacional da Metalúrgica Gerdau:

 

FLUXO DE CAIXA CONSOLIDADO
METALÚRGICA GERDAU S.A.

(pela legislação societária - valores expressos em milhares de reais)

Começaremos pw=ela parte relativa ao fluxo de caixa operacional

 

Empresa

Consolidado

 

2003

2002

2003

2002

Lucro líquido do exercício

575.179

434.028

1.256.874

821.016

Equivalência patrimonial

(610.001)

(473.446)

281.240

(447.483)

Provisão para riscos de crédito

-

-

20.618

5.452

Ganho e/ou perda na alienação de imobilizado

-

-

10.056

8.190

Ganho e/ou perda na alienação de investimentos

(1.445)

20.193

(1.556)

27.614

Indexação da dívida

5.563

9.920

136.349

761.826

Depreciações e amortizações

149

150

605.045

511.929

Imposto de renda e contribuição social

8.420

1.791

(441.456)

10.142

Juros sobre a dívida

14

2.252

593.308

464.260

Contingências/depósitos judiciais

18

(4.191)

562

2.191

Variação de contas a receber de clientes

-

-

(167.134)

(161.318)

Variação nos estoques

-

-

(207.267)

(222.708)

Variação de fornecedores

(27)

29

187.227

(46.140)

Outras contas da atividade operacional

8.656

8.487

74.557

(116.930)

     Caixa líquido da atividade operacional

(13.474)

(787)

2.348.423

1.618.041

 

Começando com o lucro líquido na primeira linha, O demonstrativo de “Fluxo de Caixa” faz ajustes para os itens não financeiros que afetam o Demonstrativo de Resultado. Um número positivo significa que estamos somando de volta ao lucro líquido aqueles itens que foram subtraídos, e vice-versa para os números negativos. Na última linha temos o resultado líquido das operações. Pense neste número como o verdadeiro lucro financeiro da empresa, ou seja, grana na mão. 

Na próxima seção nós temos as atividades de investimento:

 

 

Empresa

Consolidado

 

2003

2002

2003

2002

Aquisição/alienação de imobilizado

-

-

(873.039)

(565.851)

Acréscimo de diferido

-

-

(7.246)

(6.134)

Aquisição/alienação de investimentos

5.097

(8.661)

(67.005)

(913.011)

Recebimento de dividendos/juros sobre o capital próprio

185.108

94.425

-

-

Aplicação de caixa em investimentos

190.205

85.764

(947.290)

(1.484.996)

Fornecedores de imobilizado

-

-

2.196

(13.449)

 VARIAÇÃO DE SALDO DO CAIXA

 

380.410

171.528

-1.892.384

-2.983.441

 


As atividades de investimento são as segundas mais importantes, depois das atividades operacionais. Aqui vemos como a Metalúrgica Gerdau gasta o seu dinheiro. Ou seja, o que ela está fazendo ao invés de pagar dividendos para a gente. Estes também são investimentos que a Gerdau está fazendo para expandir o seu negócio. Note que ela em 2002 está gastando mais do que está ganhando. (nos Demonstrativos da Companhia aprendemos que isto se deve a operações de fusão e aquisição da Ameristeel e Açominas). Infelizmente, como não podemos pedir dinheiro emprestado sem juros a mãe de Joãozinho, esta diferença tem que ser pego no mercado Financeiro.

 
 
 
 
 
 
 
 

A terceira parte é relativa às atividades de financiamento:
 

 

Empresa

Consolidado

 

2003

2002

2003

2002

Financiamento do capital de giro

(7.015)

48.177

(334.804)

640.514

Debêntures

(423)

(3.281)

(347.456)

242.659

Aportes de financiamentos do permanente

-

-

454.989

1.476.379

Amortização de financiamentos do permanente

-

-

(541.308)

(1.823.826)

Pagamento de juros de financiamentos

-

(81)

(414.409)

(351.052)

Mútuos com empresas vinculadas

(2.506)

374

(16.937)

845

Aumento de capital/ações em tesouraria

(7.049)

-

(24.151)

-

Pagamento de dividendos/juros e participações

(198.413)

(137.905)

(423.399)

(259.366)

VARIAÇÃO DE SALDO DO CAIXA

 

-215.406

-92.716

-1.647.475

-73.847



Aqui podemos ver com a empresa financia as suas atividades. Os números são de dar calafrios.
 Ela pegou emprestado em 2002: $1.476.379 e pagou $1.823.826 isso tudo devido a 
expansão. (Agora estamos entendendo com esta empresa opera alavancada obviamente
 necessitaríamos mais anos de estudo para vermos este comportamento se comporta com o 
tempo).  Olha só quanto ela pagou em 2003! A Gerdau paga muito e pega muito emprestado.
 

 

 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Seção Final:
 

 

Empresa

Consolidado

 

2003

2002

2003

2002

     Variação no saldo do caixa

(38.675)

(7.739)

(244.146)

45.749

 SALDO DO CAIXA

     No início do período

63.861

71.600

1.420.236

1.003.384

     Atualização do caixa inicial

-

-

(173.736)

318.717

     Saldo inicial de empresas consolidadas no exercício

-

-

13.372

52.386

     No final do período

25.186

63.861

1.015.726

1.420.236

 

Esta última seção soma o caixa das últimas três seções e reconcilia o saldo de caixa de o próximo período.  Os 1.015.726 que você vê no final do demonstrativo é o que existirá no Balanço Patrimonial da Metalúrgica Gerdau no ano de 2004.  Aqui vemos que, ao analisarmos uma empresa, existe um grande mundo entre análises de índices financeiros e uma análise profunda de fluxo de caixa.

 

 
 

 

 

 

 

 

 

 


Um abraço de   Matt Richey e SER-

 

 

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